Hipocrisias históricas



Hipocrisias históricas




Acho uma grande hipocrisia quando ouço alguém dizer que não admira o patrimônio histórico que foi edificado por mãos escravas. Tudo deve ser analisado dentro de um contexto maior e as ações humanas não podem ser dissociadas de seu tempo.

As práticas de trabalho escravo na atualidade são sempre desprezíveis, pois rebaixam o ser humano a condições degradantes, acabam com sua dignidade e o expõem a riscos absurdos. Mas o mesmo não se pode dizer, por exemplo, de um muro de pedras ou de uma igreja construídos no século dezoito, pois dentro da atualidade histórica daquela época, isso era perfeitamente normal.

Há muitas pessoas que julgam os personagens históricos com os pesos e as medidas atuais. Mas e se essas mesmas pessoas pudessem ser transportadas para aquele distante tempo, será que se comportariam diferente? Se eu fizesse essa pergunta a quem merece ouvi-la, possivelmente ouviria que jamais se utilizaria dos cativos para se enriquecer.


Então, voltou a perguntar o porquê de comprarmos produtos fabricados na China, se constantemente somos informados pela mídia que naquele país se usa trabalho escravo de prisioneiros? E que dizer das fazendas brasileiras que são flagradas na exploração de mão de obra sem remuneração alguma? Por que não exigir das autoridades um selo de controle do trabalho escravo?

A sociedade mineradora do século dezoito somente existiu porque havia o escravo para resguardá-la. Personalidade tão importante quanto o mais influente político da época, não fosse o africano aprisionado e este país teria tomado outro rumo. É de fato muito triste conhecer a fundo a história dos cativos negros, mas isso não tira o esplendor e a beleza de uma obra edificada por suas mãos, ainda que banhadas em sangue.

Um aviso, portanto, aos que se limitam a ver o erro nos atos alheios: cuidem de trabalhar por um mundo melhor e para isso basta ser uma pessoa de seu tempo. Chega de hipocrisias históricas.

Adriano Curado