 Sentado  ao meu lado no banco do passageiro, meu pai mantêm-se pensativo e  calado, enquanto observa o malabarismo que sou obrigado a fazer para  escapar do trânsito terrível de Goiânia. Entramos pela Avenida República  do Líbano e quase bato num motoqueiro que me corta pela direita. Mais à  frente viro à direita, e um taxista “estacionado” no meio da rua, sem  ligar a mínima para o fluxo do trânsito, espera paciente por uma  passageira. Outra conversão à esquerda e, quando entre pela Rua 9, não  vou mais a lugar algum. Deparo com um fenomenal engarrafamento, com  direito a buzinas nervosas e impublicáveis palavras gritadas ao vento.
     Sentado  ao meu lado no banco do passageiro, meu pai mantêm-se pensativo e  calado, enquanto observa o malabarismo que sou obrigado a fazer para  escapar do trânsito terrível de Goiânia. Entramos pela Avenida República  do Líbano e quase bato num motoqueiro que me corta pela direita. Mais à  frente viro à direita, e um taxista “estacionado” no meio da rua, sem  ligar a mínima para o fluxo do trânsito, espera paciente por uma  passageira. Outra conversão à esquerda e, quando entre pela Rua 9, não  vou mais a lugar algum. Deparo com um fenomenal engarrafamento, com  direito a buzinas nervosas e impublicáveis palavras gritadas ao vento. Papai  ainda está calado, creio que até mesmo um pouco assustado com a  situação, e observa ainda a pressa sem controle do goianiense, a  imprudência dos que querem passar de qualquer maneira, a falta de  cortesia detrás dum volante. Ele veio de Pirenópolis para um tratamento  de saúde e tencionamos chegar ao hospital no horário marcado. Mas nem  por conta da consulta que se aproxima eu enfio a mão na buzina ou  arrisco uma manobra pela calçada, como fazem alguns motoristas naquele  exato instante.
     Papai  ainda está calado, creio que até mesmo um pouco assustado com a  situação, e observa ainda a pressa sem controle do goianiense, a  imprudência dos que querem passar de qualquer maneira, a falta de  cortesia detrás dum volante. Ele veio de Pirenópolis para um tratamento  de saúde e tencionamos chegar ao hospital no horário marcado. Mas nem  por conta da consulta que se aproxima eu enfio a mão na buzina ou  arrisco uma manobra pela calçada, como fazem alguns motoristas naquele  exato instante.
     Passado  um certo tempo, papai olha para mim e conta uma história sua que eu  desconhecia. Fala-me de sua juventude na jovem Goiânia, no princípio da  década de 1960, quando as largas avenidas recebiam pouquíssimos carros e  podia-se andar pela calçada com folga e segurança. Narra que as pessoas  se conheciam e se cumprimentavam nos jogos do Goiânia Esporte Clube, lá  no extinto Estádio Olímpico, que a meninada saltava do trampolim para  as águas barrentas do Lago das Rosas e que a grande atração da noite era  o Cine Santa Maria, na Rua 24, no Centro. 
 Sobre esse cinema, inclusive,  descreve com detalhes as moças que se enfileiravam na bilheteria e os  rapazes que as paqueravam com frases de galanteio. Papai lembra-se de  dirigir o charmoso Simca Chambord Rabo de Peixe, um clássico da década  de 1960, e ao passar em frente ao Santa Maria, acelerava com vontade e  arrancava cantando pneus.
     Sobre esse cinema, inclusive,  descreve com detalhes as moças que se enfileiravam na bilheteria e os  rapazes que as paqueravam com frases de galanteio. Papai lembra-se de  dirigir o charmoso Simca Chambord Rabo de Peixe, um clássico da década  de 1960, e ao passar em frente ao Santa Maria, acelerava com vontade e  arrancava cantando pneus.
     Enquanto  ele relembra sua juventude romântica, consigo uma brecha para escapar  da Rua 9, pela direita, e saio no Lago das Rosas, onde vemos o velho  trampolim abandonado, carente de saltadores corajosos. “Ninguém nada  mais no lago?”, estranha ele. “Não pode mais, hoje é proibido”, respondo  apressado com o pensamento no relógio. Mas ele não se dá por vencido e  continua: “Pois na minha época isso aqui ficava cheiinho de meninada,  acho até que morreu muita gente grudada no barro do fundo do lago”. Olho  para as águas sujas e imagino a agonia de atolar lá nas profundezas,  puxar o ar e não encontrar. Cruz credo!
 Chegamos  finalmente ao médico no tempo certo e ele entra para a consulta. Fico  na antessala com a cabeça fervente de pensamentos. Pergunto-me o motivo  de meu pai ter vivido numa época tão tranquila e inocente, com tempo  para um cineminha no princípio da noite, e eu ter de correr todos os  dias atrás dum relógio sempre tão veloz. Ele achava tempo para nadar nos  dias de muito calor, cantar em serenatas acompanhadas por violões e  bandolins, mas eu mal consigo passear num shopping final de semana ou  tomar uma cerveja com amigos em algum boteco.
     Chegamos  finalmente ao médico no tempo certo e ele entra para a consulta. Fico  na antessala com a cabeça fervente de pensamentos. Pergunto-me o motivo  de meu pai ter vivido numa época tão tranquila e inocente, com tempo  para um cineminha no princípio da noite, e eu ter de correr todos os  dias atrás dum relógio sempre tão veloz. Ele achava tempo para nadar nos  dias de muito calor, cantar em serenatas acompanhadas por violões e  bandolins, mas eu mal consigo passear num shopping final de semana ou  tomar uma cerveja com amigos em algum boteco. Essa  questão de qualidade de vida, aliás, preocupa-me mais quando penso nos  filhos que ainda terei. Se hoje é difícil para mim administrar a  engrenagem do tempo e adequá-la ao cotidiano frenético em que vivo, como  será quando meus filhos crescerem? Não posso prever o futuro, mas cabe a  mim trabalhar para que eles vivam melhor que nós, os goianienses da  atualidade, e que um dia, num futuro distante, leiam este texto e  entendam que, se têm uma vida mais serena e próspera, é porque seu pai  construiu um mundo de harmonia e prosperidade.
     Essa  questão de qualidade de vida, aliás, preocupa-me mais quando penso nos  filhos que ainda terei. Se hoje é difícil para mim administrar a  engrenagem do tempo e adequá-la ao cotidiano frenético em que vivo, como  será quando meus filhos crescerem? Não posso prever o futuro, mas cabe a  mim trabalhar para que eles vivam melhor que nós, os goianienses da  atualidade, e que um dia, num futuro distante, leiam este texto e  entendam que, se têm uma vida mais serena e próspera, é porque seu pai  construiu um mundo de harmonia e prosperidade.
Adriano Curado
 
8 comentários:
Oi Adriano bonito como você descreve o texto... eu lendo e visualizando os detalhes do transito, o transito anda caótico em todas as cidades... Seu pai deve ser um homem cheio de sabedoria.Desejo muita saúde pra ele. Pai sempre é a peça mais importante da nossa vida. Cabe aos seguir seu exemplos. Beijos e ótima semana.
Muito bom o texto, querido, mas não sou tão otimista... num país gigante como o nosso e que apenas alguns procuram seguir as regras, a tendência é só piorar.
Beijos, querido e uma linda semana.
Texto bem escrito e de bantante poesia. Você nos convida à reflexão sobre nosso modo de vida, sobre o cotidiano cada vez pior das grandes cidades. Depois de "Qualidade de vida", passei a refletir algumas passagens do dia-a-dia.
A sabedoria de um homem está na atenção que ele dá aos idosos, pois assim aprenderá com a experiência dos experimentados. Você conseguiu criar um texto literário perfeito, com descrição incrível do trânsito e oposição entre o almejado e a realidade. Meus parabéns. Isso mostra porque é um grande escritor.
Muuito bom seu Blog! nao poderia sair daqui sem seguir *_*
Que belo texto , uma melancolia,um saudosismo sábio do seu pai.Um tempo que não volta e que foi bem vivido.Pressa pra quê? Nós é que vivemos em um mundo individualista que ninguém se conhece.
parabéns
um ótimo dia
bjs
Qualidade de vida é bem isso mesmo, saber viver com satisfação, com tempo para as pequenas coisas. Ser feliz, enfim. Amei a postagem.
Ah!, a sabedoria dos antigos! Se eu ouvisse tudo que vovô me dizia teria sofrido menos na vida! Mas não tem jeito, aprendemos mesmo é com os erros e acertos próprios. Valeu pela postagem, você arrasou.
Postar um comentário