Há muitos anos adquiri uma terra perto das montanhas. É um lugar isolado e rústico, só se chega de carro traçado. Não foi um negócio muito vantajoso, eu sei, mas eu precisava receber meus honorários de um cliente mau pagador. Foi preciso executar a dívida na Justiça para forçá-lo a vir num acordo.
Fui advogado dele num divórcio litiogioso e bem trabalhoso. A história é sempre a mesma: enquanto se precisa do advogado, ele é seu guardião e amigo; depois que se consegue o intento, ele é seu maior inimigo. Por sorte eu tinha um contrato e o executei. Depois de muitas idas e vindas, para findar a questão que já me dava nos nervos, ele me ofereceu essa terra que falei. Aceitei para não ficar no prejuízo, mas nunca fui lá.
No ano passado, um amigo me convidou para fazermos um safári fotográfico e então me lembrei daquele sítio meu lá nas lonjuras infinitas. Quando chegamos, notei que não era lá tão longe assim. Na verdade, ficava a quarenta minutos da pequena cidade onde moro. Fiquei surpreso e alegre. Talvez não tivesse sido um negócio assim tal mau.
Subimos pela esburacada estrada, até que parei meu Troller na porta de uma cabana antiga de caçador. Era toda de toras de madeiras, piso assoalhado de ipê e janelas envidraçadas. Acabei apaixonado pelo lugar, e quando retornamos já estava com o propósito de restaurá-la. Não tinha menos de cem anos. Foram dez meses de trabalho intenso agravado pela dificuldade de transportar material até lá em cima.
Por fim, ficou pronta. Fizemos uma festa de inauguração, vieram os amigos que têm carros off-road, com espírito aventureiro. Foi muito bom.
Uso agora a cabana como um refúgio para escrever. Ela é silenciosa e muito inspiradora. Levanto-me bem cedo, abro as janelas para entrar a brisa fria da serra, coo café forte sem açúcar e então me sento na mesinha tosca de madeira, de frente para a deslumbrante paisagem. Repentinamente, personagens começam a surgir pela cabana, falam alto, gesticulam, querem viver seus enredos. Digitalizo com rapidez, não posso perder nenhum detalhe do texto que tenho em mente. Às vezes fico um dia inteiro nesse processo de criação.
Enfim, todo escritor merece ter uma cabana para dar vazão à sua criação.
Adriano Curado
Nenhum comentário:
Postar um comentário