Na torre do poente

Traidor da máfia, Alfredo sabia que estava com o fim confirmado. Teve mais certeza ainda quando sua casa foi queimada, seu carro explodiu e seu dinheiro sumiu da conta bancária. Então não encontrou outra alternativa que se refugiar naquela ilha distante, onde seria impossível rastrear sua presença.

Mas Alfredo estava enganado. Ele subestimou a poderosa máfia. E foi de muito longe que viu atracar na areia uma lancha que se aproximou em alta velocidade. Notou então que sua posição fora descoberta e que agora sua vida nada valia.

Correu sôfrego para o velho castelo em ruína e se refugiou em uma de suas torres, justo a do poente onde noite passada teve um pesadelo que lhe revelou que sua morte seria ali. Tinha consigo uma pistola e algumas balas no bolso, mas sabia que a máfia não mandaria um amador para pegá-lo. Certamente que um grande agente apareceria para dar conta do serviço sem comprometer a corporação com a justiça, onde houve a traição - nos dias atuais: delação premiada.

A porta da torre se abriu. Já sabem onde ele está. Como assim? Não importa, eles sabem. Um vulto surge e não é possível vislumbra-lo. Encaminha-se o recém-chegado até uma das janelas e se coloca contra a claridade. Só então se revela uma mulher de impressionantes silhuetas, longo cabelo e vestido curto.

— É você quem vai me matar?
— Sim.
— Eu tenho uma arma aqui comigo.
— Eu sei. É uma pistola Walther ppk 380.
— Como pode saber disso?
— Sabemos de tudo, Alfredo.
— Não pode ser.
— Você comeu ovos mexidos no café da manhã e almoçou lagosta flambada com conhaque vagabundo.
— O maldito cozinheiro não quis desperdiçar um bom conhaque.
— É sempre assim.

Ela continua lá, imóvel, as duas mãos apoiadas contra as bordas da janela, pernas levemente abertas. E se ele pudesse ver-lhe o rosto, diria que sorri.

— Não tem medo que eu atire antes de você puxar sua arma? — ele arrisca.
— Não tenho arma.
— E como pretende me matar?
— Com as próprias mãos. Mas não se preocupe porque será um golpe curto e indolor.
— E antes disso?
— Vou transar maravilhosamente com você num ato de misericórdia.

E assim foi feito. Anoiteceu e amanheceu. Logo a lancha saiu da ilha em alta velocidade. Na torre do poente um corpo queima. Já em alto-mar Alfredo e Stephanie, esse o nome dela, desaparecem sem vestígios. E na ilha o cozinheiro não mais flambará lagostas com conhaque vagabundo.

Adriano Curado

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