Cozinha caipira


Cozinha caipira de parede de adobe e chão de terra batida! Tem picumã tingida de preto nos cantos, e nos telhados a fuligem dá testemunho de muita labuta das gerações de cozinheiras. Tem cheirinho bom de comida da roça e uma paz que não acaba mais. Dá saudades das avós com seus bolinhos de chuva e dos causos ao borralho do fogão a lenha. Não havia luxo nem conforto, mas o improviso fazia o pouco se tornar fartura. Todo mundo comia na banha de porco, e vez por outra tinha carne de lata, torresmo e toucinho, mas ninguém morria por conta isso. Sapecava na garganta uma cachaça roceira que era para abrir o apatite. Enquanto isso, subia a fumaça da lenha em chama, nas panelas de barro borbulhava o caldo encorpado, no bule fervia o café fresquinho. Em noites de tempestades, queimava-se ramo abençoado na Procissão de Palmas e a trovoada logo se aquietava nas entranhas do céu. Não havia geladeira, a carne era salgada e pendurada para secar. Arroz e feijão guardava-se em tulhas de madeira ou em barricas. O arroz, inclusive, tinha que ser pilado no monjolo para retirada da casca. Depois vieram umas máquinas de beneficiar arroz na cidade, que cobrava uma parte da produção. Já o feijão era conservado na cinza para não dar caruncho. Na cozinha caipira estava a alma e o coração da casa velha.


Adriano Curado

2 comentários:

Luks Vieira disse...

Nada é melhor do que o simples, não acha?
Att.,
Luks

Claudina Ortiz disse...

Que lindo. Tanto o que foi escrito, quanto a escolha da imagem. Queria um quadro desse. Parabéns.