A gaivota, a moça e o pier



     Creio que foi o piado de uma gaivota que me acordou. Mas quando minhas mãos vasculharam a cama, encontraram apenas lençóis amarrotados e umedecidos. Então afastei a cortina e a vi caminhar firme pelo pier, ainda nas primeiras horas da madrugada, e desaparecer num mergulho cinematográfico. Adormeci com essa imagem forte na mente e sonhei com nossa pressa ansiosa de galgar a colina e colher logo a fruta madura e suculenta que nos aguardava. Acordei já com o sol no rosto. Ela ainda não estava lá, e nunca mais voltaria a estar. Teria sido tudo um sonho, uma ilusão realista? Mas e essas marcas no coração? E esses arranhões da alma? Se eu bebesse, dirigia que foi o álcool. De qualquer forma, lá está o pier e a gaivota barulhenta. Só não vejo a moça de curvilíneas ilusões.

Adriano Curado

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