O ladrão


     Nosso cotidiano está rodeado de histórias apavorantes que procuramos não dar muita atenção, senão enlouquecemos. São notícias de mendigos queimados vivos, de assaltos cinematográficos, de assassinatos por qualquer motivo ou mesmo sem motivo algum.

     Se não desviamos a atenção, o pânico toma conta e não teremos condições de tocar a vida normalmente. Nada podemos fazer para mudar o acontecido, então temos que deixar a autoridade pública cuidar disso.

     Eu sempre pensei assim. É a maneira que encontrei de sobreviver neste mundo estranho. Até o dia em que entrou ladrão lá em casa. Aproveitou que não havia ninguém lá dentro, arrombou o portão depois a porta e violou nossa intimidade. Dá um susto e uma revolta ver nossos pertences remexidos, olhar para o vazio deixado pelos bens levados. E o pior. Não poder fazer nada.

     Nesses momentos a gente se desespera. Quer a pena de morte ou a amputação das mãos do ladrão. Essas ideias malucas que normalmente não passam pela cabeça.

     Então a coisa evolui para a neura. Acho que lá em casa agora é mais protegido que o cofre do Banco Central. Tem fechaduras codificadas, alarmes sofisticados, câmeras. E por achar que ainda não é suficiente, todos os bens estão segurados. Lá em casa o ladrão não dá mais prejuízo.

     O problema é que a sensação de insegurança persiste. A gente até anda na rua de maneira diferente. Só quem já passou por isso pode entender. É como se aquelas notícias lá no telejornal, antes tão distantes da realidade da gente, saltasse de repente para a sala de casa.

     Mas a vida tem que ser tocada para frente. Vivemos num tempo difícil. As pessoas não têm mais respeito umas pelas outras, são individualistas e até egoístas. Já vai longe a época romântica das cadeiras nas calçadas e das visitas nos finais de semana. Vai tão longe que não volta mais.

     Se essa é a regra de sobrevivência, temos que nos adaptar a ela. Dançar conforme a música. Mas eu ainda tenho, lá no fundo da mente, esperança em dias melhores. Quero viver o suficiente para testemunhar uma nova sociedade, em tempos melhores que os atuais.

Adriano Curado

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