A
Comissão Nacional da Verdade concluiu, por meio de documentos do
Arquivo Nacional e aqueles entregues à polícia do Rio Grande do Sul
pela família do coronel Júlio Miguel Molinas Dias, assassinado no
fim do ano passado em Porto Alegre, que o ex-deputado Rubens Paiva
foi morto, sob tortura, nas dependências do Doi-Codi do Rio,
localizado na Rua Barão de Mesquita, na Tijuca. Isso desmontaria a
versão oficial montada pelo Exército de que Paiva foi sequestrado
enquanto estava sob sua custódia.
O texto
em que o coordenador da Comissão Nacional da Verdade, Claudio
Fonteles, analisa os documentos foi divulgado nesta segunda-feira
pela Comissão. Este é o segundo conjunto de textos divulgados por
Fonteles, cujo mandato termina no próximo dia 15. Em 22 de novembro,
Fonteles havia divulgado 11 textos, nos quais resumia suas pesquisas
no Arquivo Nacional, auxiliado por assessores da CNV.
Rubens
Paiva foi preso por uma equipe do Cisa, da Aeronáutica, em 20 de
janeiro de 1971, em sua casa, no Rio. Segundo texto divulgado no site
da Comissão, os documentos que estavam com Molinas confirmam que,
após ser preso, Paiva foi entregue ao Doi-Codi no dia seguinte.
Fonteles
encontrou no Arquivo Nacional o Informe SNI 70, de 25 de janeiro de
1971, até então inédito, no qual os agentes da repressão narram
como foi a prisão de Paiva e sua origem. O Cisa recebeu ordem de
revistar um avião vindo do Chile, que pousaria a 0h do dia 20 de
janeiro. Entre os passageiros estavam Cecília de Barros Correia
Viveiros de Castro e Marilene de Lima Corona, que traziam cartas de
asilados políticos para o ex-deputado. Com a prisão delas, os
militares chegaram até Rubens Paiva.
O informe
não fala sobre a fuga ou sequestro de Paiva, que teria ocorrido em
22 de janeiro, segundo a versão oficial do Exército.
Em
depoimento, Cecília afirma ter visto Paiva com as mãos amarradas,
"os olhos esbugalhados" e muito vermelho, com a camisa
desalinhada e com manchas de sangue. Ela relatou que os dois foram
levados num carro até o Doi-Codi, onde até hoje funciona a Polícia
de Exército. Segundo ela, durante o interrogatório, ela foi
obrigada a repetir seu nome, quando uma luz muito forte era acesa em
direção a seu rosto. Ela disse que ouviu o nome de Rubens Paiva ser
pronunciado várias vezes numa sala próxima. Em determinado momento,
ouviu essa voz masculina pedir água e um médico.
O texto
de Fonteles fala ainda sobre os documentos do Arquivo Nacional com o
depoimento do tenente médico do Exército Amilcar Lobo, prestados à
Polícia Federal em 1986. A oitiva ocorreu em meio a uma tentativa de
reabrir a investigação sobre o caso Paiva no início da
redemocratização.
No
depoimento, Lobo afirma que foi chamado em casa numa madrugada de
janeiro de 1971 para assistir Rubens Paiva e que foi levado à cela
onde ele estava. Quando o examinou, constatou que o ex-deputado
estava com "abdômen em tábua, o que em linguagem médica pode
caracterizar uma hemorragia abdominal, sendo que naquela situação
parecia ter havido uma ruptura hepática" e que o paciente
afirmara ser o ex-deputado.
Lobo diz
ter aconselhado que o preso fosse hospitalizado. No dia seguinte,
quando assumiu seu horário de serviço normal, o médico diz ter
sido informado que o paciente que atendera havia morrido. Lobo afirma
ter visto escoriações em Paiva e que pode afirmar que ele havia
sido torturado.
A versão
apresentada pelo comandante do I Exército, Sylvio Frota, em
fevereiro de 1971 foi a de que Rubens Paiva fugiu quando o carro da
Força que o conduzia foi interceptado por terroristas no momento em
que ele era levado para prestar esclarecimentos. Segundo Fonteles, os
depoimentos e os documentos desmontam esta versão.
Fonte:
Site Agência O Globo
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